Publicado originalmente como titulo Aluno responde professor da UTFPR que diz que SISU é sorteio de vagas no Blog O Charuto

Prof. Dr. Rafael C. Barreto

Em resposta ao seu e-mail, preciso fazer algumas considerações. Sou filho de pais sem estudo, de mãe empregada domestica e serei na minha família até o momento o primeiro e único a se formar em engenharia em uma universidade publica

A minha vaga nesta universidade eu conquistei com dedicação e esforço após três anos sem conseguir passar no vestibular da USP e UNICAMP em SP, de onde sai para estudar em Curitiba – PR. Portanto não devo deixar de reconhecer que as políticas de acesso ao ensino superior foram fundamentais para tornar isso possível, entre elas o SISU.

O que o senhor chama de “sistema de seleção muito forte” em defesa do vestibular eu chamo de sistema de exclusão.

A universidade no Brasil tem seu inicio marcado pela elitização, onde apenas a aristocracia tinha acesso. Durante seu desenvolvimento a universidade evoluiu e assumiu cada vez mais seu papel como instituição de pesquisa e desenvolvimento do conhecimento no pais. Porem somente nas ultimas décadas a universidade passa a assumir também sua responsabilidade com o desenvolvimento social e o combate as desigualdades histórica no Brasil, acolhendo em seus bancos estudantes que habitam as periferias, pobres, negros, indígenas e quilombolas. Estes estudantes tem as mesmas capacidade de aprendizado que qualquer outro estudante que teve todas as condições socioeconômicas e educacionais favoráveis nos ensinos fundamental e médio.

Portanto não se trata de “sorteio de vagas” e sim de garantia de direitos constitucionais ao ensino e ao desenvolvimento, intrínsecos de cada pessoa humana, independentemente de sua condição social e econômica. O SISU e outras políticas como a Lei nº 12.711/2012 (Lei de Cotas), o Decreto nº 7.234/2010(PNAES) e Decreto nº 5.493/2005(PROUNI) são políticas essenciais e indispensáveis, ainda que com suas contradições, para a efetivação deste direito.

Primeiramente, os dados que você apresenta sobre retenção e trancamento não justifica qualificar como sendo um “impacto negativo” a presença destes alunos na universidade. Vejo como uma atitude preconceituosa essa sua afirmação, que é na verdade o principal argumento utilizado por aqueles que não aceitam ver estudantes antes excluído ocupando um espaço que não foi pensado para ele estar presente.

Em segundo lugar, não é justo colocar a culpa nos estudantes e nos seus colegas professores. Dados apresentados no relatório do Perfil sócio econômico e cultura do FONAPRACE, referentes ao conjunto das universidades federais, mostram que mais de 60% dos estudantes dependem das políticas de assistência estudantil para se manterem na universidade sendo que mais de 40% são estudantes de alta demanda desta políticas pertencentes as classes socioeconômicas C, D e E. A UTFPR esta inserida nesta realidade e ainda assim no mês de Setembro, em pleno semestre letivo, a universidade não pagou a bolsa permanência dos estudantes, deixando milhares de alunos sem qualquer condição de pagar aluguel, alimentação e transporte.

Como estudar e ter bom desempenho nestas condições? Ou melhor, nesta falta de condição.

Apesar das políticas de acesso abrir as portas das universidades, as praticas administrativas e o sistema de ensino permanecem elitista e excludentes. A construção de uma universidade mais democrática passa por uma reformulação deste sistema. Além das dificuldades advindas destes fatores temos de enfrentar situações de preconceitos como esta, que culpa os estudante.

Em 5 de outubro de 2015 13:11, Rafael Barreto <[email protected]> escreveu:

Oi Leandro

Sem dúvida alguma você é um vencedor por perseverar e superar tantas dificuldades.

E sem dúvida nenhuma o vestibular é um processo de exclusão e o ensino superior no Brasil é voltado para as classes mais abastadas.

Entretanto não leve minha análise a mal… não estou dizendo que *todos* os alunos Sisu são despreparados, ou que devemos voltar ao modelo do vestibular, ou mesmo que a culpa é dos alunos.

Esse não é o foco da minha discussão.

Estava apenas contextualizado o porque da mudança de perfil discente, e justificando porque os professores tiveram (e ainda tem) dificuldade em trabalhar com esse novo público.

Ou seja, precisamos melhorar os professores.

Te desejo muito sucesso, Leandro. Espero que você (e muitos outros) saiam bem formados de nossa universidade e ajudem a melhorar nosso país.

Abraços
Rafael